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  • Foto do escritorArthur Gadelha

Na atualidade das inteligências artificiais, ‘A Resistência’ estanca na reciclagem

★★☆☆☆ | Diretor de Rogue One (2016), Gareth Edwards oferece uma história tão atual quanto superficialmente antiga sobre a dualidade homem/máquina

Não é coincidência que dois grandes filmes do cinema americano lançados neste ano discutam a inteligência artificial como uma "nova" etapa na forma como a humanidade compreende seus próprios valores sociais, morais e financeiros. Em "Missão Impossível 7" essa entidade autossuficiente é uma ameaça invisível, intangível e irrastreável, restando a Ethan Hunt destruí-la antes que outras grandes forças a tomem para causar colapsos diversos na estrutura digital do mundo. Já em "A Resistência", que chega aos cinemas com uma divulgação bastante tímida, ela tem corpo, voz, e não está aqui para ser antagonista.


É curioso aproximarmos esses filmes tão díspares porque a relação das chamadas IAs com a espécie que se presume ser sua criadora foi o estopim para desencadear uma revolta dos atores de Hollywood contra a substituição de seus corpos por versões digitais, o que levou o SAG a determinar uma das maiores greves da indústria americana que segue em curso. Essa história não é recente, apesar de contemporânea - quem não lembra dos debates sobre o retorno do falecido Paul Walker na despedida de Velozes e Furiosos?


A trama deste filme, porém, não tem qualquer presunção de se somar a essa conversa porque ela está bem mais interessada em olhar religiosamente para o passado em suas criações analógicas - aqui os robôs feitos à imagem e semelhança são perseguidos por erros humanos e formam uma frente de resistência a esses ataques, na esperança de que uma arma secreta ainda em desenvolvimento possa cessar a guerra e mostrar a humanidade que eles podem conviver em harmonia.


A percepção da existência desse mundo impressiona já nos primeiros minutos quando somos apresentados ao seu contexto por meio da televisão e, em seguida, pousamos num ataque litorâneo que acontece num fim de noite, ou amanhecer, com scanners azuis e efeitos sonoros intrigantes. De repente, as forças políticas e as regras que operam essa realidade se tornam bastante lúcidas, assim como a assertividade dos planos que estão em curso: de um lado, aniquilar aquele que se entende ser o criador das máquinas, e, do outro, interromper o conflito.



A partir de então, a inteligência artificial vira um detalhe de cena e o filme se contenta em elaborar seus elementos de um pomposo "filme de guerra". As imagens, especialmente nas repetidas sequências de ação, têm uma densidade bastante atraente para que passem desapercebidas, ainda mais quando são envoltas pela trilha do sempre competente Hans Zimmer.


Aos poucos, como a direção da história não ousa causar qualquer suspensão de expectativas, vai ficando perceptível o quanto a alma de seu drama central está comprometida pela ausência de novidade, apoiando-se numa compaixão quase tola com a criança que tem seu destino traçado ao homem enviado para destruí-la. Apesar do esforço do John David Washington em dar gravidade a mutação sentimental de seu personagem, da indiferença à devoção em relação a essa outra forma de vida, o que está ao redor parece não fazer qualquer esforço para se distanciar das obras que fundaram tudo o que está ali.


Puxando pelos mais recentes, de "Blade Runner" ao próprio "Rogue One", do diretor, há uma coleção de revoluções cibernético-robóticas condensada em cada uma das arestas dessa história, às vezes até de forma literal. Na metáfora cansada de criador/criatura e nas diretas referências ao modus operanti de guerra dos EUA criando inimigos pelo Oriente, a trama ganha sobrevida, usando referências religiosas para dualizar com a brutalidade de uma violência contra "os diferentes", mas logo tudo estaciona. Fora dessas discussões, o eixo central da inteligência artificial é tão genérico e ensosso que não sobra nem a emoção da homenagem sobre o que pensávamos das máquinas, e nem o frescor de um novo olhar sobre o que pensaremos no futuro.

 



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