"Zodíaco" e "Mindhunter": os crimes de David Fincher nos anos 1970
ENSAIO Separadas por 10 anos, Zodíaco e Mindhunter são produções quase irmãs de David Fincher
A conexão entre os mais poderosos de todos os produtos de David Fincher sobre assassinos é brilhante. No recente, é o próprio FBI que enfrenta o desafio de entender essas mentes, enquanto Zodíaco coloca um civil numa aventura semelhante. A sensação de que estou falando era de me perguntar se essas histórias que acontecem nos anos 1970 poderiam se fundir, pensando no que Robert Graysmith (um simples cartunista) contaria ao agente Holden Ford. E se eles trabalhassem juntos?
Assim como Hitchcock imprimiu durante anos uma esfera dramática em todos os seus suspenses, Fincher certamente é um nome semelhante em filmes de "crime". O que chama a atenção em sua maneira de contar é a escolha muito precisa do que será exibido para o espectador já que nada é suficientemente claro em qualquer momento; não importa se ele colocou um spoiler no meio do roteiro pois sua capacidade de manter o suspense (da escola de Hitchcock) é precisamente baseada numa atmosfera de medo. Vemos as sombras do Zodíaco na primeira cena e traços de seu rosto durante todo o filme, Fincher mostra suspeitos e todos os fatos, mas ninguém arrisca um fim. Portanto, não há surpresa quando Os Suspeitos do Denis Villeneuve parece ser exatamente algo que Fincher teria feito já que no filme também temos todas as informações, sentimos todas as dores de todos os personagens, mas nada, nunca, é suficiente.
Assistindo Zodíaco em seu décimo aniversário (alguém pode acreditar?), me peguei pensando sobre seu ritmo. Na obra-prima de Fincher, a rotina de um jornal era guia para uma história que nunca termina (não era o FBI ou qualquer coisa que possamos imaginar). Inacreditável que quase trinta anos estivessem encaixados em um script (de 1968 a 2004). Na prática, estamos constantemente pulando entre eventos separados por dias, semanas e anos inteiros, assim como em Mindhunter. Obviamente é mais fácil para o produto da Netflix por causa de seu formato seriado - Holden e Graysmith, no entanto, atingem um carisma muito poderoso em histórias tão dramáticas, apesar de seu tempo de tela.
Fincher não está interessado em nos mostrar as mortes, mas as histórias continuam no sentido da ultraviolência. A loucura dos assassinatos de Zodíaco nos segue por quase três horas, independentemente da presença do assassino. Quando Graysmith descobre o autor do desenho que suspeita, é uma cena avassaladora porque Fincher não nos diz o que esperar - rapidamente, todos ficamos apavorados. Um momento muito semelhante acontece no final da temporada do Mindhunter, quando Holden enfrenta Edmund Kemper no hospital. Só nesses momentos, não importa se estamos vendo personagens reais ou fictícios; eu sabia que Holden e Graysmith da vida real ainda estão vivos, mas por alguns segundos pensei que eles iriam morrer.
Esse enigma move tudo o que sabemos sobre filmes de suspense e joga com isso. As cores também estão naquele enigma - o que pode parecer uma escolha popular colocar um amarelo constante para mostrar "o passado", nas mãos de Fincher este se torna maior em contraste com um azul frio. Todos estão mergulhados nesses tons de uma vida desbotada, cansada, angustiada - as partes que se distanciam disso são pequenas, minimalistas e sufocantes. A vida social e sexual de Graysmith e Holden, além de seu pequeno tamanho na trama, é afetada por esses problemas. Em Clube da Luta (1999) isso é mais aberto porque é o inverso (a vida impulsiona todos os problemas), e essa matemática é a mesma em A Rede Social (2011) quando um homem perde tanto fazendo inimigos.
Sentimos que as fórmulas não são específicas para um tema, mas apenas nestes filmes (podemos incluir Se7en de duas décadas depois) isso se converte em nosso medo. No subconsciente, o mistério deixado sobre a identidade do Zodíaco faz os olhos se arregalarem com os créditos - oh, será que ele pode estar nas ruas? Ele poderia ter assistido a este filme?
Algumas pessoas ficaram insatisfeitas com o fim do Zodíaco e Mindhunter, talvez por pensar que são histórias sobre os assassinos, enquanto são apenas sobre as jornadas "nos bastidores". Os filmes são mais difíceis porque tem um protagonista que só quer ter certeza sobre suas suspeitas - quando ele afunda, não há motivo para continuar. No caso de Mindhunter é diferente já que sua segunda temporada está garantida - mas a primeira termina quando Holden cruza uma linha terrível com um assassino. É demais para a trama, e Fincher se despede rapidamente com um monte de questões a serem resolvidas (incluindo um assassino que nunca vimos em trabalho).
Essas histórias permanecem porque todas as respostas estão no ar. Ninguém sabe - nem nós, nem os personagens, nem a história, nem mesmo Fincher, e esse é um bom lugar escuro para se estar.
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