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  • Foto do escritorArthur Gadelha

No mundo de Ted Lasso existe Papai Noel

ENSAIO Quase na metade da segunda temporada, quarto episódio de Ted Lasso (2021) propõe um gesto delicado sobre o "mundo real"

Lançado na última sexta-feira, 13 de agosto, o antecipado episódio de natal do atual carro-chefe da Apple TV+ pode ter sido mais revelador do que parece. Ao longo de "Canto dos Sinos", jogadores e funcionários do AFC Richmond experimentam separados a fria noite de natal enquanto refletem sobre suas amizades e famílias. Ao fim, quase todos estão reunidos aleatoriamente, no meio da rua, dançando e cantando sobre a radiante alegria que é estar vivo e feliz. Sem muita cerimônia, o filho mais novo do Higgins olha para cima e vê um trenó cortando o céu - é essa a imagem nunca revelada, mas que sempre esteve lá.


Ainda nos primeiros minutos do episódio de estreia lá no ano passado, desconfiamos sobre a verossimilhança de tudo o que torna Ted Lasso uma série confortável: um técnico tão genuinamente bondoso convocado para liderar o time de um esporte que não domina, e que cativa os demais não pela assertividade profissional, mas por sua personalidade afetivamente explosiva. Do lado de cá, o efeito é o mesmo aos que ainda suportam consumir uma alegria assim tão explícita e recheada de nuances.


O jogador-estrela abandona seu egocentrismo, o durão se propõe ao diálogo, a mídia se torna respeitosa, a ricaça negligente volta a acreditar no time que finalmente se torna uma equipe. Somando as transformações que Ted provoca naquele universo de forma tão sóbria, e súbita, fica claro em certo ponto que nada do que está ali parece com o mundo real - e não por um pessimismo declarado a "integridade humana", mas por um pensamento realista sobre mídia, mercado, política e poder. Mas o que importa é que isso nunca realmente importou para quem se viu hipnotizado pela narrativa de "pessoas boas num mundo mal" e que aprendem com os próprios erros. Ted Lasso, série e personagem, nunca quiseram prestar contas com esse mundo real. Com o objetivo de contagiar até o espectador alheio ao submundo de regras, aparências, técnicas e egos do futebol, Ted Lasso se vê feliz na fantasia.


Ao mesmo tempo, como o tom de humor construído não se contenta com fórmulas (como Brooklyn 99 ou Modern Family), a série parece bem instalada na realidade. Relacionar-se com essa dualidade soa como um convite para que a nossa vida se pareça um pouquinho com essa história onde tudo acaba bem, mesmo que os planos deem errado. Mais que uma tola mensagem de esperança, a imagem de um trenó cortando o céu de uma "noite feliz" é também um aviso para nós que estamos tão apegados a esses personagens: no mundo de Ted Lasso, Papai Noel existe - um gesto delicado que nos faz lembrar como é possível trazer para o lado de cá uma fantasia tão boba e carinhosa.


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