Arthur Gadelha
Gramado: Em "Todos os Mortos", a abolição e o pavor da paranoia branca
CRÍTICA Na competitiva do 48º Festival de Gramado, uma história que se limita ao tentar emular uma dualidade entre seus núcleos
"Você é diferente dos outros, deve estar vivo ainda"
O que mais me impressiona nesse filme é sua forma redutiva ao tratar tantas contradições de um Brasil escravocrata. Essas transformações na divisão dos séculos XX e XXI é contada em cômodos privados e locais distantes. O que é atraente por expor uma intimidade com a forma pessoal que o fim da abolição repercutiu no imaginário branco de uma família em falência, inclusive na constante tentativa de manter esse antigo Brasil presente de qualquer forma possível. As paranoias (sãs e inconscientes) da família branca diante essa ruptura são tratadas como tal; Isabel, Ana e Maria perambulam por suas realidades como fantasmas prestes a desaparecer.
Do outro lado, numa dualidade que certamente merecia ser mais justa, desenvolve-se Iná como o símbolo livre de uma família negra que por muito tempo foi ligada a ora bruta ora silenciosa crueldade da branca. A interpretação de Mawusi Tulani é o que há de realmente forte nessa história, não me parece possível reagir passivo ao movimento que sua personagem empurra numa trama infelizmente pálida pela origem do seu ponto de vista. Iná se transforma assim que surge e parece reagir até certa coerção do roteiro em lhe dar o espaço devido. As cenas do piano, do reencontro e da discussão religiosa são exemplos dos caminhos que "Todos os Mortos" poderia ter escolhido de forma mais objetiva se quisesse ser uma história integralmente forte.
★★★½
Direção: Caetano Gotardo e Marco Dutra
País: Brasil (SP)
Ano: 2020
*Filme assistido no 48º Festival de Cinema de Gramado
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