Arthur Gadelha
Sinfonia da Necrópole: delicadeza macabra da cidade
Juliana Rojas concebe um filme de alma sincera. Uma produção que sabe ser “original” muito além do próprio formato.
“Fabulando” a história de Deodato, um coveiro que teme a morte, Juliana não deixa que sua pauta caia nas reflexões muito lógicas sobre o cenário que registra. O primeiro momento musical, inclusive, além de funcionar como uma apresentação ao ritmo levemente cômico e agradável que permeia toda a obra, também o dignifica com conformismo. As vozes “não profissionais” em cena criam um cenário de proximidade admirável e a quebra entre a “realidade” e “fantasia” perde cortes bruscos.
O coveiro profissional, o senhor que sonha em morrer, o padre sistemático, o empresário da funerária, a mulher que se acostumou com a morte. Essa gama de personagens se torna interessante com muito pouca apresentação; isso porque o contraste com Deodato é sempre distante. E Juliana não maquia seu roteiro de atenções divergentes; deixa claro desde a expressiva cena inicial que somos Deodato. O que se torna um ponto de estratégia narrativa, já que os temas que o filme suscita só a ele são pertinentes – aos outros é besteira.
Ainda assim, um dos grandes momentos musicais não se compreende exclusivamente como cinema. A teatralização da cena perde um pouco de seu impacto real e, pela primeira vez, há uma dificuldade de tornar o envolvimento de Deodato real. Mas o objetivo artístico permanece intacto. Sua estrutura, inclusive, tenta oscilar muito tendo como principal justificativa a aproximação entre Deodato e Jaqueline – ora superficial e somente funcional, ora muito engenhoso (como a belíssima canção dos caixões). Mas em toda essa montanha russa há aspectos sólidos sobre o que debate, mesmo que nas atuações principais (Eduardo Gomes e Luciana Paes) ainda falte ambição.
De todo modo, ‘Sinfonia da Necrópole’ é formidável. Confortável de se assistir e principalmente muito envolvente (algumas canções não saem da minha cabeça), um filme para além da diversão.
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