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  • Foto do escritorArthur Gadelha

Cine Ceará: "A Filha do Palhaço" encara drama familiar com um carinho estático

CRÍTICA Exibido na abertura do 32º Cine Ceará, novo longa de Pedro Diógenes sabe lidar bem com o limite da sua encenação

Mesmo que conte a história de uma garota em busca do pai que a abandonou muito jovem, A Filha do Palhaço é na verdade um filme bastante simples. Constatação que é uma surpresa por si só, dada a coleção de filmes recheado de novos gestos que tem Pedro Diógenes na direção e roteiro. Mesmo quando se desfez o coletivo Alumbramento, do qual ele foi peça-chave, resistiu seu olhar por novas fusões, como é o caso de Pajéu (2020), que atravessa ficção e documentário de forma inesperada para revistar o passado de Fortaleza. Olhar para este seu novo capítulo propõe um misto de sensações que nunca partem, propriamente, da simplicidade, que nunca deixa de ser em si confortante, mas da forma como os elementos potencialmente mais influentes são estabelecidos.


Diante do emaranhado de conflitos que esse mote familiar pode alimentar, especialmente pelo pai se sustentar com shows de humor para turistas, o que vemos se construir na tela é tudo muito moderado e, comicamente, sóbrio. Especialmente pelas encenações entre pai e filha, vividos aqui pelo experiente Démick Lopes e a estreante Lis Sutter, dupla que quando juntos não imprime tanta emoção, tornando relativa a sutileza do roteiro escrito por Amanda Pontes, Michelline Helena, e pelo próprio Pedro.


Orbitando esses personagens, claro, há outras camadas de melancolia, o que devolve ao filme sua beleza e sinceridade. Jesuíta Barbosa brilha desde o primeiro segundo em que aparece, e o tom de alegria e mistério em seu personagem é mantido para dar a essa história um grau de paixão tão feroz quanto delicado, às vezes quase sublime, como o Coelho em Inferninho (2018). As cenas de sua introdução no bar com Démick, a performance do teatro com Jupyra Carvalho (que também brilha), a atração na festa, são momentos bastante altos, mesmo que sejam tão pequenos.


Alinhada com a fotografia que enquadra uma solidão noturna, as músicas e a trilha sonora avançam sobre esse sentimento difícil de acessar. Além de artistas como Getúlio Abelha, Luiza Nobel, Luiz Gonzaga e Uirá dos Reis ressoarem no momento certo, a obra conta ainda com trilha e músicas originais de Cozilos Vitor e João Victor Barroso. "Temos nos olhos os cheiros da cidade... e como dói", ouvimos enquanto Joana se abre para a possibilidade de ter o pai por perto. Nesses trechos, há um filme inesquecível.


Quando a história chega ao fim, somos informados de algo que certamente pairou sobre a cabeça de muitos cearenses ontem no Cineteatro São Luiz: Silvanelly, personagem que é livremente inspirado na Raimundinha, personalidade famosa por aqui que é interpretada em shows de humor pelo Paulo Diógenes. Nessa camada do filme também tem um gesto de cuidado na representação de uma comédia que, apesar de todas as limitações e reciclagens, faz parte da nossa identidade cultural.


A Filha do Palhaço é um filme manso, bonito e uma ótima escolha para assistir com a família. Numa espécie de "Inferninho versão urbana", essa história também é, do seu jeito, uma carta de amor aos que "não deram certo", aos que encaram a arte e o humor como uma forma de responder essa vida tão esburacada. "Tu acha que eu tenho cara de palhaço?", pergunta Marlon com a cara toda pintada, sorri acanhado, e termina de virar seu copo de cerveja porque o bar tem que fechar. Nas entrelinhas de um carinho imóvel, sobrevive o sonho do reencontro, seja ele de quem for.


É loucura não ouvir o coração

Desse jeito, a gente pede pra sofrer

Eu não quero te ver na solidão

Tô fazendo muita falta pra você

Tô Fazendo Falta, Joanna

 
 

Esta crítica integra a cobertura do 32º Cine Ceará


Direção: Pedro Diógenes

Roteiro: Amanda Pontes, Michelline Helena, Pedro Diógenes

Produção executiva: Amanda Pontes, Caroline Louise

Direção de fotografia: Victor de Melo

Direção de arte: Thaís de Campos

Montagem: Victor Costa Lopes

Som: Lucas Coelho

Edição de som e mixagem: Lucas Coelho

Trilha original: Cozilos Vitor, João Victor Barroso

Figurino: Lia Damasceno

Direção de produção: Clara Bastos

Produção: Marrevolto Filmes

Distribuição: Embaúba Filmes

Elenco: Lis Sutter, Demick Lopes, Jesuíta Barbosa,

Jupyra Carvalho, Ana Luiza Rios, Valéria Vitoriano,

Patrícia Dawson, Luiza Nobel, David Santos, Rafael Martins

País: Brasil

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