Arthur Gadelha
Ventos de Agosto: o paraíso não existe
Estreia na ficção de Gabriel Mascaro flerta com documentário enquanto reflete sobre sua própria presença
"Aqui quem morre não vai nem pro céu e nem pro inferno. Vai pro mar"
Embora a narração visual paradisíaca que Mascaro elabora sobre esse cenário, não há qualquer prazer nato à Shirley, personagem que vive ali como se estivesse presa à eterna contemplação sem sentimento. Essa relação ácida com a natureza meditativa, inclusive, lembra os ventos ameaçadores em "Linz - Quando Todos os Acidentes Acontecem", de Alexandre Veras, onde o protagonista acaba sumindo junto da cidade sucumbida pelas dunas.
Mas aqui, a surpresa mais delicada é que a história de Shirley já nasce resolvida sem a intenção de desfecho ou transformação, uma personagem destinada àquela paisagem, à sua relação de amor e indiferença. Essa história serve de prólogo ao verdadeiro conflito que pertence ao estrangeiro (pesquisador que visita a comunidade para registrar os ventos), mas que é projetado fora dele, num curioso vínculo entre a existência natural e os instintos irracionais de luto e afeto. Essa estreia de Mascaro na ficção é silenciosamente brilhante.
★★★★★
Direção: Gabriel Mascaro
País: Brasil
Ano: 2014
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