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Foto do escritorArthur Gadelha

Mostra SP: O silêncio de "Casa de Antiguidades" se esgota

Discutindo racismo e ancestralidade à partir do suspense, uma estreia pouco digestiva

Quando os créditos iniciais surgem invertidos, pinta uma desconfiança de que o primeiro longa de João Paulo Miranda Maria tenha apreço por um conflito que existe na estética. Se confirma quando a primeira cena aproxima um cotidiano operário a uma ficção científica: o "astronauta" que, como um clássico viajante estelar, parecerá o terráqueo sempre alienígena ao olhar de uma vida extraterrestre. Por debaixo da roupa de segurança está o mítico Antonio Pitanga na pele de Cristovam, um homem negro que se muda para uma antiga colônia austríaca no sul do país. Mas é com o desenvolvimento dessa premissa provocante que outra coisa se confirma: a trama é refém da própria aparência.


É só depois da introdução exagerada pelo abismo entre a pose do operário e os trejeitos tragicômicos de coerção do empregador, que Casa de Antiguidades reage ao espectador frio com o que tem de mais expressivo: o silêncio de Cristovam sobre um vilarejo que lhe cala com os olhos, a violência encarnada na subjetividade explícita de um povo cujo sangue ainda ferve o horror. A brutalidade construída ao redor da ausência de corpos como o de Cristovam parece criar uma ebulição da controversa violência física e psicológica. Parece crescer alguma fúria por debaixo do olhar cansado de Pitanga, e os incansáveis travellings estão sempre dispostos a impor algum suspense na forma como esse personagem é cercado de hostilidade. Chega um ponto que parece terror.


É quando todas as cartas estão na mesa que o filme, porém, não encontra potência em qualquer outro elemento usado a seguir como forma de estender a projeção. É inexpressivo quando JPMM usa esse suspense para momentos frágeis cenicamente como a do flagra sexual, a presença física da ancestralidade ou a relação com a cidade, por exemplo. Apesar de ter Antonio Pitanga encabeçando o elenco, a direção de atores é tão sisuda e sem contrastes que se faz parecer uma composição amadora. Nada realmente se transforma aqui apesar da aparência ser de uma jornada e Cristovam nunca encontra um destino - e tampouco o roteiro está interessado em subvertê-lo. É por isso que a expectativa se cansa no próprio suspense.


Na metade do filme, a ausência de movimento faz com que nem mesmo a beleza dos planos admire mais - à medida em que se desenrolam, eles se esgotam na redundância já que estão apoiados num texto que dá volta em círculos por considerar este o caminho ideal para a construção de uma atmosfera onírica.


Talvez Casa de Antiguidades funcione como a história de um personagem que vai se esquecendo diante do tédio devastador e da opressão "lá fora". O sumiço da sua vontade, de sua identidade. Há um excelente filme rodeando essas questões. O que realmente parece salvá-lo é o que resta de dúvida nas imagens, no olhar distante e calado do protagonista, nas sensações do horror. O recorrente travelling da janela em direção a ameaça "invisível", por exemplo, é uma tensão que poderia resumir o conflito identitário-racial que deu origem à essa realidade. Mas são momentos muito pequenos para se apoiarem na narrativa que não tem muito a dizer além disso.

 

★★

Direção: João Paulo Miranda Maria

País: Brasil

Ano: 2020


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