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  • Foto do escritorArthur Gadelha

Cannes 2019: O delírio de "Bacurau" leva o festival ao assombro

O filme que retorna o Brasil à competição pela Palma de Ouro recebeu uma boa impressão


Kleber Mendonça Filho não é ‘menino novo’ em Cannes. Em 2019, será a terceira vez que vai ao festival levando filme seu para competição, mas a 20ª que pisa como espectador. Kleber teve uma longa carreira como crítico de cinema antes de se debruçar na realização em cinema, chegando até a misturar as artes no documentário Crítico (2008), e nessa jornada o festival francês há muito tempo se tornou parada obrigatória. Hoje é ainda mais divertido acessar seus blogs antigos e ler suas reações aos filmes e premiações de Cannes, principalmente pela competência com que realizava essa cobertura. Em um dos posts, diz ser o único dos profissionais que não dormia uma sessão sequer da programação.


Com Bacurau, seu aguardado terceiro longa-metragem codirigido com Juliano Dornelles, Kleber faz a memória nos levar a Glauber Rocha. Terra em Transe estreou em 1967 na 20ª edição do Festival, exatamente três anos após a estreia de Glauber com Deus e o Diabo na Terra do Sol numa memorável edição que contava ainda com outro brasileiro, Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos. O mesmo acontece agora, e Cannes recebe Bacurau três anos após os aplausos que Aquarius recebeu - e mesmo com o prévio sucesso internacional de O Som ao Redor, foi ali que Kléber nasceu para o mundo. Em 2019, essa fama se renova. Sabendo pouco (ou quase nada como se confirmou em seguida) sobre o filme, o público brasileiro aguardava com tensão a exibição de Kleber na noite dessa quarta-feira, 15, muito pela nossa empatia - afinal, ver o cinema brasileiro alçando voo pelo mundo é um do prazeres que gostamos de sentir. É uma sensação de afirmação, orgulho e resistência, ainda mais em tempos tão incertos que vive nossa cultura. Acompanhando os tweets que saíram imediato ao fim da sessão, bem como as críticas mais rebuscadas que saíram pelos jornais mundo afora, parece fácil - e assustador - resumir a recepção que a obra recebeu: mesmo com uma impressão amplamente elogiosa, os espectadores e críticos de cinema saíram da sessão atônitos, sem saber com precisão como traduzir a mistura de gêneros que a dupla Kleber e Juliano conceberam no sertão nordestino. Western, ficção científica, aventura, comédia... Parece mesmo ser tudo isso e, por aqui, ficamos apenas na expectativa. Confira abaixo um apanhado das principais reações de Bacurau: "O filme que representa o Brasil na corrida pela Palma de Ouro nesta 72ª edição do Festival de Cannes, podemos dizer, dificilmente encontra um par no cenário da nossa produção cinematográfica nos últimos 25 anos. Bacurau é um verdadeiro E. T. na filmografia brasileira. Qualquer tentativa de encaixotá-lo dentro de um gênero específico – ou intenção dramatúrgica – poderá pôr em xeque a própria análise que o tenta classificar." Luiz Joaquim (Cinema Escrito) "Desta vez, o protesto não ocorreu no tapete vermelho, ela jogou seu próprio filme. O diretor brasileiro Kleber Mendonça Filho apresentou nesta quarta-feira em Cannes "Bacurau", um filme de gênero abundante em sangue e carga política." Anna PELEGRI (24 Martins) "De tom mais cômico que os longas pregressos de Kleber, “Bacurau” é também mais hermético que “O Som ao Redor” e “Aquarius”. O cineasta parece ter escolhido trocar um cinema repleto de mensagens diretas, muitas vezes expressas sem rodeios na boca dos personagens do seus títulos anteriores, por um outro com referências mais alegóricas." Guilherme Genestreti (Folha de S. Paulo)

"Imediatamente mais vigorosos e mais inescrutáveis ​​do que o trabalho anterior de Filho, “Bacurau” mergulha mais fundo no território da meia-noite à medida que suas ideias centrais se consolidam, seus fantasmas se tornam literais e seus heróis pegam em armas." David Ehrlich (IndieWire) "É um filme realmente estranho, começando em uma espécie de etno-antropologia e estilo documentário, tornando-se uma parábola de rebanho envenenado ou um sonho febril e depois um banho de sangue no estilo jacobino. É um filme completamente distinto, executado com clareza e força implacáveis." Peter Bradshaw (The Guardian) "É uma aposta ambiciosa, que mistura elementos de tradições e lendas popular brasileira com outras pessoas ligadas à ficção científica (a acção tem lugar no futuro próximo), westerns (Sergio Leone Quentin Tarantino), o slasher, Gore e uma forte alegoria política muito sintonizada com esses tempos." Diego Batlle (Otros Cines) "Bacurau é um exemplo em cápsula da colonização econômica do Brasil pelos EUA e Europa e do domínio cultural americano. As escolhas musicais ecléticas e de longo alcance refletem isso - os padrões brasileiros sarcásticos de Caetano Veloso e Geraldo Vandré coexistem com o trabalho eletrônico distópico de John Carpenter, Night." Wendy Ide (Screen Daily) "É admirável, vale apontar, a fluidez com que a narrativa salta de um gênero a outro, de um tema a outro e de uma alegoria a outra de uma maneira que deveria resultar em caos, mas acaba por criar uma estrutura coesa na qual elementos conflitantes de complementam perfeitamente, equilibrando-se entre John Carpenter e Glauber Rocha, entre o naturalismo e o fantástico e entre o horror e a (quase) ficção-científica." Pablo Villaça (Cinema em Cena) "Entrando com afinco no cinema de gênero, Kleber Mendonça Filho e o co-diretor Juliano Dornelles usam um terrível safári humano no nordeste brasileiro para expor os complexos problemas do país." Peter Debruge (Variety) "Esta não é uma dessas produções que busca agradar o espectador a todo custo: ela se move por um caminho peculiar, ciente de sua heterogeneidade, deixando ao público a tarefa de acatar, ou não, as subversões propostas." Bruno Carmelo (AdoroCinema) "Depois de "Aquário", Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles filmam a luta dos aldeões do Nordeste do Brasil contra um exército de matadores, em uma distopia furiosa." Luc Chessel (Liberation) "É difícil citar um filme brasileiro mais eletrizante do que “Bacurau”, capaz de manter seu dinamismo de viradas inusitadas do começo ao fim de suas 2h10 sem perder a sutileza com que promove a autopsia em corpo vivo da falência democrática nacional" Rodrigo Fonseca (Estadão) "Bacurau chegou à competição oficial de Cannes com a sombra de Aquário . Ambos os filmes não apenas compartilham Sonia Braga, mas também exploram a diversidade social a partir da radiografia ou da estrutura alegórica. No entanto, Bacurau vai além e dá outro tom. É um ponto e distante na filmografia de Kleber Mendonça Filho, e que ofusca o já conhecido estilo do cineasta."

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